Ancestralidade e ressignificação identitária em "Um rio chamado tempo, uma casa chamda Terra", de Mia Couto.
Ancestralidade e Identidade, Voz e Oralidade, Experiência e Memória.
O diálogo entre história e literatura possibilita a compreensão dos eventos que marcam a sociedade e sua cultura e, no âmbito das literaturas de matriz africana, leva a refletir sobre a diáspora, a qual, segundo o sociólogo e teórico cultural, Stuart Hall (2003), remete a questões da miséria e da busca de oportunidades que acabam por desintegrar a identidade devido a perda do contato matricial. Não obstante a perda do contato matricial, ao elevar-se como voz no sentido social, histórico e cultural conforme a perspectiva de Paul Zumhtor, o sujeito a recupera, posto que se torna voz do individual e do coletivo, reconectando-se, desse modo, com sua ancestralidade. É nessa direção que caminha a obra “Um rio chamado Tempo, uma casa chamada Terra”, do escritor moçambicano, Mia Couto, tendo em vista a questão diaspórica presentificada na voz do personagem Marianinho. Partindo de tais considerações, objetivou-se compreender como se configurou a ressignificação identitária do personagem, na medida em que seu deslocamento implicou um retorno às raízes e, portanto, à ancestralidade. Nessa perspectiva, a metodologia de pesquisa, pautada na revisão bibliográfica, mobilizou os conceitos de diáspora, a partir de Stuart Hall (2003), de oralidade e voz, em Paul Zumthor ( 1997,2005) e Laura Padilha (2007); de experiência e memória, a partir de Walter Benjamin (1987); e de alegoria, também a partir de Walter Benjamin (1984), os quais foram aplicados em fragmentos da narrativa, considerando as marcas orais no texto escrito. Esta pesquisa se justificou, na medida em que permitiu-nos refletir sobre as narrativas enquanto expressões culturais da diáspora, pois este estudo possibilitou compreender a hibridização cultural e as questões identitárias, as quais se fizeram notar na obra analisada. Constatamos que os objetivos propostos foram alcançados, pois verificamos que os elementos linguísticos, sobretudo as marcas orais presentes na narrativa, corroboraram a ressignificação identitária de Marianinho, cuja voz se erigiu como ancestralidade. Sobre o problema que norteou a presente pesquisa, acreditamos que o deslocamento de Marianinho corrobora a sua identidade, e nesse sentido, sua ancestralidade, tendo em vista as cartas recebidas pelo avô Dito Mariano que, ao serem lidas durante o retorno à aldeia, o levam a reconstruir sua história, na qual estão entrelaçadas as do povo de Luar do Chão. Assim, confirmamos a hipótese sobre a conscientização de que Marianinho jamais deixara suas raízes e desse modo, o coletivo e o individual, bem como o passado e o presente, os quais foram se delineando e confirmando sua identidade. Diante disso, acreditamos ter contribuído com as pesquisas de estudiosos contemporâneos que se debruçam sobre a temática, de modo a reiterar a importância da voz na perspectiva histórica, social e cultural, levando em conta a experiência, a construção e preservação da memória, e nesse sentido, da identidade.