Absurdo, revolta e medida em Albert Camus: a arte como transgressão do real
absurdo, revolta, medida, arte, imagem, história.
Em seus Carnets, Camus esboçou o desejo de trabalhar com três mitos gregos: Sísifo,
Prometeu e Nêmesis, que figurariam como representação estética e ponto de partida para o
desenvolvimento de três conceitos que perpassam toda sua obra: absurdo, revolta e medida,
respectivamente. Os comentadores identificam dois ciclos bem definidos no pensamento
camusiano: do absurdo e da revolta. Cada um desses ciclos seria composto por uma obra
ensaística principal, um romance e uma ou duas peças de teatro. Camus vale-se de linguagens
bem distintas para abordar um mesmo conceito e até mesmo ultrapassá-lo. Nesse sentido, o
filósofo pied-noir apresenta uma rejeição ao formalismo sistemático e ao enaltecimento da
razão enquanto única dimensão do homem, valorizando a construção do pensamento através
de imagens. O romance e a arte em geral aparecem como instrumentos capazes de alcançar as
demais dimensões do humano, que não se limitam à razão, mas recorrem à sensibilidade
despertada através de vivências indiretas - isto é, leitura e experimentação de narrativas
ficcionais. Nessa ponte entre filosofia e literatura, ou filosofia e imagem, Camus concede
lugar de destaque à criação artístico-literária, que figuraria como uma das poucas alternativas
ao homem lúcido que deseja, ao mesmo tempo, ultrapassar a cruel realidade do mundo, sem
no entanto se desvincular completamente do realismo que é necessário a uma lucidez
consciente. O ciclo da medida (ou do amor), apesar de interrompido pela morte precoce do
autor, representaria o ápice de sua proposta filosófica, que estaria situada no equilíbrio entre
dois extremos: a absolutização da história e o completo desligamento do real. Sua proposta
seria conciliar o engajamento histórico consciente sem, no entanto, se limitar à história e, por
outro lado, ultrapassá-la sem se desligar por completo da realidade.